(Valor Econômico) – 13/04/2017
A recuperação do valor das cotas dos fundos imobiliários listados na B3 (BM&FBovespa), observada do ano passado para cá, abriu uma frente para a emissão de novas ofertas. Sob o mote da redução do juro básico brasileiro, que pode fechar o ano em um dígito, gestores e estruturadores buscam suprir uma demanda por diversificação dos investidores que começa a ficar mais premente.
Na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) são nove as ofertas públicas registradas neste ano, no valor de R$ 1,826 bilhão, e outras sete com esforços restritos sob a regra da instrução 476 que dispensa registro prévio e limita a distribuição a 50 investidores, com R$ 189 milhões.
Há ainda seis operações em análise, que podem movimentar R$ 1,341 bilhão. Se as ofertas sob avaliação da autarquia receberem sinal verde, o volume de registros, de R$ 3,36 bilhões, já representará mais da metade de tudo que veio a mercado no ano passado, quando o setor movimentou R$ 6,04 bilhões entre ofertas amplas e colocações via 476.
Nessa nova safra há estruturas conservadoras, como dois fundos que compram recebíveis de crédito da Kinea, braço de investimentos alternativos do Itaú, e um do Bradesco, que também compra títulos e cotas de outros fundos imobiliários. Há também operações que vão testar o apetite do investidor para carteiras com ativos reais.
A própria Kinea tem um fundo de incorporação e permuta com a construtora Even, e um de “tijolo”, no jargão do setor, com um portfólio diversificado para proporcionar renda. Há ainda uma estrutura inusitada da gestora H11 Capital, liderada pela Planner, que vai comprar ativos do setor funerário no fundo batizado “Brazilian Graveyard and Death Care”.
Mas há um caso que não passou pelo filtro do investidor, o do JPP Capital Value, criado para comprar imóveis retomados de mutuários inadimplentes, ao não alcançar a captação mínima necessária para rodar.
De qualquer forma, a maior atividade do setor sucede uma valorização significativa das cotas dos fundos imobiliários listados na bolsa. No ano passado, o Ifix, o índice que representa a média de 128 portfólios listados na bolsa, apresentou valorização de 36,8% e, em 2017, avançou mais 8,7% até o pregão de 12 de abril. Tal movimento permitiu que as cotas recuperassem no secundário parte do valor perdido em anos sucessivos de Selic nas alturas. Segundo levantamento da Citi Corretora, o desconto médio na bolsa em relação ao valor patrimonial está em 10%, em comparação a 36% do pico, em abril e setembro de 2016.
“Ainda parece um bom ponto de entrada para investidores focados em valor e com uma visão de longo prazo”, diz a analista Larissa Nappo, uma das responsáveis pelo raioX mensal do setor, ao lado de Cauê Pinheiro. Para a especialista, as oportunidades podem estar em imóveis que hoje têm vacância alta ou contratos com carência que não estão recebendo fluxo no curto prazo.
Os fundos imobiliários são um híbrido de renda fixa e variável. As cotas são negociadas em bolsa, oscilando conforme as negociações no pregão, e contemplam uma fatia de renda, com a distribuição de dividendos. Sobre essa parcela não há incidência de imposto de renda para pessoa física apenas sobre ganho de capital dos ativo na bolsa.
O movimento recente que se viu no Ifix foi pautado justamente pela trajetória de queda da Selic, que saiu de 14,25% em agosto para 11,25% anuais, ontem. Com as taxas futuras apontando para a casa de um dígito há projeções para a Selic entre 8% e 9% no fim do ciclo de alívio monetário abre-se uma janela para ofertas subsequentes de fundos já existentes, diz Luís Costa, associado da área de investimentos imobiliários da Rio Bravo.
“Com o valor de mercado abaixo do valor patrimonial havia uma distorção que tornava as emissões inviáveis. Isso não só diluiria o cotista, como também traria uma perda ao colocar uma cota mais barata no fundo.” Do lado do investidor, Costa calcula que, na média, os fundos imobiliários que compõem o Ifix vêm pagando um retorno em dividendo (o “dividend yield”) de 8,9% ao ano, difícil concorrer com o CDI, mesmo considerando a alíquota mais baixa de IR (15%), o que levaria o indicador a 10,4%. “Mas como os fundos se valorizaram e o horizonte é de redução de juros, a expectativa é que investidores muito alocados em renda fixa procurem outras classes de ativos.”
Se a Selic estiver em 9% no fim do ano, ao se excluir a alíquota menor de imposto, de 15%, por exemplo, o fundo imobiliário em tese poderia ainda assegurar retorno acima do CDI, de 7,7%.
Bruno Laskowsky, exexecutivo-chefe da Cyrela Commercial Properties (CCP), que assumiu recentemente a área de ativos imobiliários do Credit Suisse HedgingGriffo, espera a recuperação de ciclo imobiliário para meados de 2018. E vê parte da poupança do brasileiro, do institucional, a exemplo dos fundos de pensão, à pessoa física, se deslocando para ativos de base imobiliária.
“Nos mercados mais maduros, o sistema de previdência tem uma alocação relevante em ‘real estate’. É um modelo mais defensivo. Se tudo der errado, você tem o ativo real.” Conforme quantifica, com cerca de R$ 60 bilhões em fundos imobiliários, listados ou não, o segmento no Brasil representa fatia de menos de 1% do PIB. Nos EUA, os chamados Real Estate Investment Trust (Reit) têm uma participação de 7% a 8% do conjunto das riquezas nacionais. Para Laskowsky, há também uma mudança em curso na cultura das novas gerações que tendem a valorizar menos a posse de imóveis, e podem ver nos instrumentos de base imobiliária uma forma mais eficiente de investir no setor.
Nos tempos das vacas magras, foram os portfólios que compram papéis com lastro em crédito imobiliário (certificados e letras de crédito imobiliário ou hipotecárias) que mostraram maior resiliência, e os primeiros a reagir. Na próxima fase, serão os fundos “de tijolo”, com ativos reais, que tendem a recuperar valor na bolsa, a começar pelas carteiras de galpões logísticos e hospitais, em que a vacância costuma ser menor, diz a chefe da mesa de fundos imobiliários da XP Investimentos, Tatiana Scarparo. “Já houve uma precificação da Selic em queda, mas não a taxa abaixo de dois dígitos, o desconto ainda vai se fechar mais.”
No curto prazo, o mercado brasileiro ainda vai conviver com um ambiente microeconômico adverso e será preciso analisar fundo a fundo, adverte Carlos Fonseca, chefe da área de ativos imobiliários e sócio do BTG Pactual. Ele diz preferir fundos de crédito imobiliário e de renda comercial.
“No Rio, a vacância ainda é altíssima, esse tipo de ativo vai levar tempo para se recuperar, mas em São Paulo a taxa em algumas localidades voltou para a casa dos 20%, e deve cair para metade disso em 2018”, diz. Ele cita que para o ano que vem há a previsão de entrega de cerca de 100 mil metros quadrados e depois disso não há mais ofertas no radar. “Para tomar a decisão de investimento e desenvolver um ativo comercial leva cinco anos mais ou menos. Se alguém resolver investir e desenvolver em 2018, só vai entregar em 2023.” Por esse raciocínio, com a oferta mais enxuta, os ativos tendem a se valorizar e dar maior poder de barganha para os locatários.
Os preços dos imóveis parecem estar na fase final de acomodação e dificilmente vão cair mais, mas a recuperação dos ativos de base imobiliária tende a não ser plana, não vão ser todos os instrumentos que vão performar, diz Valdery Albuquerque, principal executivo do banco de investimento do Fator.